Como se desenrola o processo de Intervenção assistida por equinos
- almagreterapias
- 22 de dez. de 2024
- 7 min de leitura
O processamento é da experiência é essencial.
Para além das atividades, há o processamento que se refere à reflexão e integração das experiências emocionais e comportamentais vividas durante as atividades com os cavalos. Diferentemente de participar numa atividade com o equino, o processamento é a parte onde a aprendizagem emocional e psicológica ganha forma e pode ser usada para promover a mudança. Essa fase é conduzida por um psicoterapeuta que, além de acompanhar o especialista equino na atividade com os cavalos, ajuda o cliente a explorar e atribuir significados que surgem dessas interações. Observa-se, identificam-se emoções, padrões, analisa-se, relaciona-se, compreende-se e integra-se as experiências para poderem ser aplicadas no quotidiano. Dele fazem:
I- A actividade
Na Atividade, o terapeuta e o cliente trabalham para identificar e ativar uma experiência emocional ou memória que será o foco do processamento. Esse primeiro passo é essencial, porque permite ao cliente aceder a uma área emocional ou memória específica que precisa ser processada, mas que, até então, pode estar reprimida ou mal integrada. A Atividade é estruturada para iniciar o contato do cliente com o conteúdo emocional, mas de uma forma que segura, diferentemente de uma re-experiência traumática intensa. A atividade procura ativar a memória, as emoções e o self, permitindo ao cliente conectar-se com a emoção ou memória sem se sentir desprotegido, em perigo ou sobrecarregado.
O cliente trás uma emoção ou evento específico que será trabalhado. Pode ser um trauma, uma situação de conflito emocional ou mesmo uma sensação interna que cause desconforto. Abordar e aprofundar essa memória é uma escolha que deve ser feita, pelo psicoterapeuta, de acordo com a capacidade emocional do cliente naquele momento, respeitando o seu nível de tolerância e evitando ativações excessivas.
O psicoterapeuta intervém quando necessário com perguntas, reformulações, validação, com metáforas assim como técnicas de auto-regulação e de segurança emocional. É fundamental que o cliente possa enfrentar a experiência emocional de forma segura.
A fase da Atividade é fundamental para "desencadear" o processo psicológico, pois permite que o cliente aceda e ative redes de memória que, de outra forma, ficariam provavelmente recalcadas e reprimidas. Em termos clínicos, esse é um passo inicial para a ressignificação da experiência emocional, pois permite que o cliente e o terapeuta trabalhem em cima de uma memória ou emoção ativa, promovendo uma oportunidade de cura real e profunda.
II- O(s) cavalo(s)
Os cavalos, altamente sensíveis ao comportamento humano, aos seus estados e emoções revelam-nos muito ao longo da atividade.
Existem 3 padrões de comportamento equino, ao longo da atividade, que serão reveladores e devem ser notados:
Mudanças (de Estado): refere-se a mudanças perceptíveis e imediatas no comportamento do cavalo em resposta à energia e ao estado emocional do cliente. Essas mudanças são significativas porque o cavalo, sendo um animal muito sensível ao ambiente, reflete rapidamente as flutuações emocionais e energéticas da pessoa. Essas mudanças permitem ao psicoterapeuta e ao cliente observar, em tempo real, como as emoções internas afetam a interação com o ambiente.
Os cavalos frequentemente demonstram mudanças de estado através e essas reações,
embora subtis, são sinais de que o cavalo está a responder à presença emocional do paciente.
Para o psicoterapeuta, essas mudanças são valiosos, pois indicam pontos de tensão ou
relaxamento emocional no cliente.
Reflexão sobre o Estado Emocional: Uma mudança no cavalo pode ocorrer no momento em que o cliente acede a uma memória ou emoção importante como um sinal externo de que o cliente está a processar uma experiência emocional significativa.
2. Padrões: referem-se a comportamentos repetitivos ou consistentes que o cavalo exibe em resposta aos estados emocionais e comportamentais do cliente. Esses padrões são importantes, porque ajudam a identificar dinâmicas emocionais e psicológicas recorrentes que o cliente talvez não perceba conscientemente.
3. Algo Único: É a capacidade dos cavalos de proporcionar uma experiência de conexão emocional profunda e genuína, sem as barreiras de comunicação verbal e julgamentos, através de um comportamento não usual e por isso denominado de único.
Esse momento único geralmente é uma resposta imediata dos cavalos ao estado emocional do cliente, sem interpretações ou julgamentos. É essa autenticidade imediata que cria um espaço seguro onde o cliente pode explorar e expressar as suas emoções sem medo de crítica e que tem uma ação altamente transformadora. São geralmente momentos impactantes que geram insight, autoconhecimento e mudança profunda.
III- O cliente (o grupo)
Os cavalos atuam como co-terapeutas, refletindo de forma autêntica os estados emocionais e comportamentais dos clientes e grupos durante as sessões. A interação com os cavalos revela insights valiosos sobre o indivíduo e a dinâmica grupal, permitindo ao psicoterapeuta identificar áreas que necessitam de atenção e desenvolvimento. O psicoterapeuta deverá apontar as incongruências, colocar perguntas pertinentes, elaborar metáforas a tudo o que considerar relevante para o desenvolvimento pessoal ou grupal.
Em relação ao cliente individual:
Autoconsciência e Regulação Emocional: Os cavalos respondem diretamente às emoções e comportamento do cliente. Por exemplo, se o cliente está ansioso ou tenso, o cavalo pode demonstrar inquietação ou afastamento. Essa reação imediata ajuda o cliente a tomar consciência de seu estado interno e a trabalhar a regulação emocional. A observação do comportamento do cavalo serve como um espelho, permitindo que o cliente reconheça e ajuste as suas emoções e comportamentos.
Padrões Comportamentais e Comunicação: A interação com os cavalos pode revelar padrões comportamentais, como necessidade de controle, dependência e submissão ou fuga e evitamento, assim como patologia. Reconhecer esses padrões permite ao cliente explorar e modificar comportamentos que podem ser disfuncionais.
Em relação ao grupo:
Dinâmicas de Liderança e Cooperação: Os cavalos são sensíveis às dinâmicas de grupo e podem destacar questões de liderança, cooperação e comunicação entre os membros. Por exemplo, se um grupo apresenta falta de coesão, o cavalo pode demonstrar resistência ou confusão durante as atividades. Isso indica a necessidade de trabalhar a comunicação e a colaboração dentro do grupo.
Papel Individual dentro do Grupo: A interação com o cavalo pode revelar como cada membro do grupo se posiciona e contribui para a dinâmica coletiva. Identificar esses papéis permite ao psicólogo abordar questões específicas e promover uma maior integração e participação de todos os membros.
O psicoterapeuta mantém uma postura de facilitador, permitindo que o cliente conduza as interpretações, reflita de maneira aberta para que o próprio cliente perceba as possíveis origens emocionais de suas reações. Essa abordagem delicada e exploratória ajuda o cliente a reconhecer as suas projeções emocionais e padrões relacionais sem julgamento, usando o cavalo como um elemento neutro e acolhedor para explorar suas próprias emoções e reações.
3- A Equipa nas Intervenções Assistidas por Equinos
As Intervenções Assistidas por Equinos envolvem uma equipa multidisciplinar e interdisciplinar, onde cada membro desempenha um papel fundamental para garantir que as interações entre o cliente e o cavalo sejam terapêuticas e seguras.
A composição da equipa pode variar dependendo do contexto e dos objetivos da intervenção, mas geralmente incluirá os seguintes profissionais:
Psicólogo Clínico cuja função é ser responsável por liderar a intervenção do ponto de vista terapêutico. Supervisiona o processo de terapia, guia o cliente nas suas reflexões e faz a ligação entre as atividades com os cavalos e os objetivos psicoterapêuticos específicos. No contexto de IAE, o psicólogo clínico é essencial para interpretar as respostas emocionais e comportamentais do cliente e facilitar a transformação terapêutica.
As suas responsabilidades são avaliar o cliente antes da intervenção, identificando as suas necessidades e criar um plano de intervenção que integre a interação com cavalos.
Observar e analisar o comportamento do cliente durante a atividade com o cavalo, ajudando a identificar padrões emocionais ou comportamentais. Facilitar a reflexão guiada (processamento) que ocorre após as atividades, ajudando o cliente a perceber o que aprendeu sobre si mesmo durante a interação com o cavalo.
Estabelecer metas terapêuticas claras (ex.: melhorar a regulação emocional, desenvolver a autoconfiança, reduzir a ansiedade).
Colaborar com o restante da equipa para assegurar que as atividades com os cavalos estão adequadas ao estado emocional e às capacidades do cliente.
O psicólogo trabalha em estreita colaboração com o especialista equino e a restante equipa para garantir que as atividades com os cavalos estejam adequadas ao estado emocional do cliente. Ela também comunica à equipa outros elementos importantes da história clínica do cliente que possam influenciar a intervenção. Reavalia e ajusta a intervenção: Após cada sessão, o psicólogo revê o progresso do cliente, ajustando as metas terapêuticas conforme necessário, e pode colaborar com outros profissionais para ajustar a intervenção.
Nas intervenções assistidas por equinos, o psicólogo clínico é responsável por garantir que a experiência com o cavalo seja mais do que apenas uma interação física, mas um processo profundo de auto-descoberta e desenvolvimento pessoal. Ele interpreta os comportamentos e emoções que emergem durante a atividade, facilitando a reflexão e promovendo mudanças terapêuticas duradouras.
2. Especialista equino: é responsável pelo maneio do cavalo, pela segurança durante as atividades e por intervir fazendo notar comportamentos dos equinos assim como apontar mudanças comportamentais dos cavalos e padrões. Este profissional tem um conhecimento profundo do comportamento dos cavalos e do maneio seguro, garantindo que as interações entre o cliente e o cavalo sejam seguras e controladas. As suas Responsabilidades são escolher o cavalo apropriado para cada cliente, levando em consideração as características do animal e as necessidades terapêuticas do cliente e acompanhar o psicólogo como se fosse uma dança; acompanhar e orientar o cliente nas atividades práticas, como conduzir o cavalo ou cuidar dele; Garantir a segurança física do cliente e do cavalo durante toda a sessão. Auxiliar o cavalo a reagir de forma adequada às necessidades do cliente, ajustando a atividade de acordo com o comportamento e personalidade do cavalo e do cliente.
3. O Equino: O cavalo, embora não seja um "profissional" no sentido tradicional, desempenha um papel central nas IAE. Ele age como um co-terapeuta silencioso, espelhando as emoções e os estados de espírito do cliente. Os cavalos são altamente sensíveis ao ambiente e às energias humanas, tornando-os agentes naturais de feedback emocional. Os cavalos selecionados para intervenções terapêuticas devem ter um temperamento calmo e serem trabalhados para reagir “adequadamente” ao comportamento humano, especialmente quando lidam com clientes emocionalmente vulneráveis. Eles proporcionam uma experiência não-verbal de interação, essencial para o desenvolvimento de competências como confiança, empatia, comunicação e autocontrole.
5. Outros Terapeutas (dependendo das necessidades do cliente) podem ser incluídos na equipa, como psiquiatras (que acompanham o progresso do cliente, especialmente quando há uma necessidade de ajuste medicamentoso), terapeutas ocupacionais, fisioterapeutas (em casos onde a intervenção também vise objetivos físicos), professores de yoga e facilitados de mindfulness.
Chantal Feron
Psicóloga clínica e Coach inscrita na Ordem dos Psicólogos Portugueses com o número 013236
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